terça-feira, agosto 23, 2016

Quatro poemas de Jaci Maraschin



VII 3.16 

 o espírito cheio de plumas 
paira por sobre as sumas 
teológicas 

 e mancha com seu amarelo ouro 
o pseudo tesouro 
e o palavrório 
de são Ligório 

 o espírito cheio de fendas 
vem sobre as lendas 
como fumaça 
e com soluços revela 
no meio de uma favela 
o olhar e a mão 

 vem santo espírito pomba 
e arromba a nossa porta de ferro 
desce do céu como pomba 
sobre o meu berro 


 XVI 7.7 

 no fundo de tudo
no fundo de todos
só resta a resolução nunca tomada
de estender as mãos
e deixar
que elas se alonguem como palmeiras
até as praias


LXVIII 19.29

abandonemos as casas
para chegar à casa
e sejam bênçãos
os telhados e os jardins

não amamos os que amamos
transitórios e estranhos
quando os possuímos

a vida eterna
é transição
abre com sua argúcia
as portas da participação


LX 18.21

                    meu próximo começa no meu pé

ponte flutuante de transição
e da peregrinação

                    meu próximo começa no meu sorriso

reflexo necessário da alegria
na ambivalente melodia

                    meu próximo começa na minha boca

palavras comida e gosto
na floração do rosto

                    meu próximo começa na minha mão

carícia entre solidão e abismo
no companheirismo

                    meu próximo começa no meu corpo

solidariedade da carne e dos ossos atômicos
nos debruços anatômicos

                    meu próximo começa no meu sexo

direção vertiginosa do beijo e dos gens
num chafariz de bens

                    meu próximo começa no meu começo

Do livro Rastro de São Mateus (Sociedade Religiosa Edições Simpósio e UMESP, 1998).

sábado, agosto 13, 2016

Semeando na Passagem, poema de Jilton Moraes


Semeando na Passagem

Qual semeador,
vivemos a semear;
o tempo todo semeamos,
enquanto passamos:
o dia todo, todos os dias;
semeamos com um fim,
semearemos até o fim.

A semente da apatia
não se deve plantar,
porque quem se ocupa
em semear a indiferença,
afastará amigos,
dos amigos se afastará,
e amizade profunda
jamais cultivará.

Todo cuidado é pouco
com os inimigos da paz...
Eles estão no caminho,
disfarçados de amigos,
a semente da discórdia plantando.
O melhor é deles passar distante,
para seguir viagem,
sem se ferir nos espinhos.

Estejamos bem atentos
aos que semeiam rumores:
eles tornam amigos em inimigos,
disseminam a desordem
onde tudo antes era ordem.
Entretanto, apesar de agora abraçados,
findam tristes, sozinhos, isolados.

A semente do orgulho
é outra que atrapalha na passagem,
bloqueando o canal entre as pessoas,
impedindo a compreensão da mensagem.
Deixa pais e filhos sem comunicação,
torna o que antes era uma família
na mais terrível confusão.

Por isso, enquanto passamos,
jamais devemos ser indiferentes,
mas estar prontos para ajudar,
em nome de Jesus socorrer,
ao pobre que estende a mão
e ao agressor que carece perdão.

Porque quem, em sua passagem,
com alegria semeia o amor,
tem bons amigos toda vida,
encontra amigos seja onde for.

Aquele que a semente da paz
sai semeando em seu caminho,
ainda que não ande entre flores,
sabe se livrar dos espinhos.

Quanto mais maturidade temos,
mais ocasião para fazer vivemos.
Porque a mulher ou o homem maduro
tem aprendido a ter um coração puro,
sendo capaz de sementes altruístas lançar.

Vivendo a melhor idade,
compreendamos as demais idades,
vivamos para fazer sempre o bem,
sementes altruístas plantando,
e nos alegrando em ajudar alguém.

Jilton Moraes. Ilustrações e poemas para diferentes ocasiões. São Paulo: Editora Vida.

domingo, agosto 07, 2016

Dois poemas de Wolô


Bem-aventurados os mansos
No encontro das Alianças
Com as bem-aventuranças
Falava o Mestre amado
Aos seus e pra multidão

No encontro da Lei com a Graça
Sem gritos nem ameaça
Seu gesto e seu recado
Tratavam de mansidão

E num país subjugado
Aprouve ao Mestre amado
Bem-aventurar os mansos
Porque a terra herdarão

Que terra seria essa?
Que preciosa promessa?
A pátria de seu descanso?
Espécie de céu no chão?

O manso sabe o segredo
De renunciar sem medo
Aos ícones deste mundo
Tão passageiro, tão vão

E nem mesmo o dedo em riste
De um mundo espantado e triste
Assusta por um segundo
O manso em adoração

Pois Cristo, o Senhor de tudo
Igual um Cordeiro mudo
Sem honra seguiu, sem nada,
Pra cruz, nossa salvação

Mas nem essa morte inglória
Barrou a sua vitória
E a Vida ressuscitada
Triunfou em ascenção

E assim o manso caminha
Na fé que o Mestre tinha
Que o amor do Pai tudo encerra
Sob sua perfeita mão

E mansamente se entrega
E a mansidão ele prega
Pois mesmo ao pisar a terra
Seu pé não se prende ao chão


TEUS

Teu preceito é tão amigo 
Teu abrigo tão sagrado
Teu chamado tão preciso 
Teu juízo tão perfeito;
Tua vontade
é que eu te aceite
O teu deleite
é que eu te agrade.
Teu ser
que desceu
menino
nos deu
o poder
divino
de conhecer
a fonte
o norte;
de renascer
de um ontem
morte
Pra tua VIDA,
Pra tua VIDA.

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